quarta-feira, 8 de dezembro de 2010

Lamparina da vida

Era com uma lamparina que minha querida avó, dona Fransquinha, falecida aos 103 anos, jogava luz sobre as noites em breu na pequena Guanacés de 30 anos atrás. Na sua simplicidade e sempre amabilidade, ela, na verdade, iluminou mais do que corredores, quartos e mesmo o assombroso quintal que dava para o cemitério do distrito de Cascavel.

Foi uma luz na minha vida, ainda que ela nunca tenha sabido disso. Lembro que era em um velho baú, de onde ela tirava alguns poucos livros, que eu depositava as minhas maiores curiosidades e expectativas de criança. Vibrava a cada vez que ela revirava aquela arca à busca de alguma - a meu ver - preciosidade, onde depois olhava admirado as figuras e os desenhos das letras. Até hoje não esqueço de um desenho de letra que, hoje, me parece que era a Bodoni.

Sua ação intelectual sobre mim só hoje consigo avaliar. Era sem intenções, mas carregada de uma força inigualável. Nos primeiros anos de minha alfabetização, lembro que batia cabeça e não conseguia ler a palavra RAY-O-VAC. Por mais que tentasse, jamais conseguia juntar as palavras e formar algo pronunciável e ainda mais com sentido. Num certo dia, daqueles sem mais ou menos significação do que outro, dona Francisca - a Fransquinha do Zé da Rufina (meu avô) -, como num toque de mágica, realizou uma verdadeira revelação ao me ensinar como pronunciar aquela estranha junção de letras. Até hoje guardo com dedicado zelo esse desvendamento como parte das minhas mais profundas reminiscências.

Espero que neste espaço possamos eu e minha doce e querida filha Carol realizar uma conversa sobre temas das diferentes formas de arte e moda. E que a mesma lamparina de dona Fransquinha esteja sempre abastecida do querosene e, assim, possa nos iluminar.

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